Jerónimo de Sousa: "A camarada devia dizer: vão para a esquerda"
Recebido por muitos populares em terra insuspeita de ser comunista, Jerónimo garantiu que o governo sabe bem a política de empobrecimento que anda a fazer.
som do Ave Maria tocado ontem pelos sinos do Centro Paroquial de Moscavide, quando Jerónimo de Sousa cumprimentava idosos que dali assistiam à passagem da comitiva da CDU, não passou despercebido a duas idosas: "É para o abençoar."
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Isso ver-se-á na noite do próximo domingo, quando forem conhecidos os resultados eleitorais. Para já, o líder comunista continua a mostrar sentido de humor, desde logo na forma como iniciou a sua intervenção perante dezenas de reformados, pensionistas e alguns jovens. Tendo ouvido a apresentadora aconselhar os presentes a irem "para a [sua] direita", a fim de deixarem a rua livre para o trânsito, Jerónimo corrigiu, sorridente: "A camarada devia virar-se de costas e dizer: vão para a esquerda."
Mais a sério, sem esconder a satisfação de ver como tantos populares se lhe tinham dirigido numa terra "insuspeita de ser comunista", Jerónimo de Sousa deixou uma garantia: "Este governo, ao contrário do que muitos afirmam, que é incompetente, não é. Sabe bem o que está a fazer. Faz esta política por opção própria, de empobrecimento e de exploração de quem trabalha ou quem trabalhou."
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Para quê? "Isto tem um objetivo central: transferir os rendimentos dos trabalhadores, dos reformados, dos pequenos e médios empresários para o grande capital que, ultimamente - particularmente aquelas empresas do PSI 20 -, arrecadaram dezenas de milhares de milhões de euros à custa dessa transferência, dessa política que apoia, que abençoa, que protege esses senhores do capital", explicou o secretário-geral do PCP.
Acompanhado, entre outros, do antigo líder parlamentar comunista e atual presidente da Câmara de Loures, Bernardino Soares, Jerónimo lançou uma exortação: "É preciso acabar com isto, é preciso derrotá-los!" Vários minutos antes, a meio da rua onde iniciara a arruada matinal, a comitiva da CDU passara ao largo de uma idosa vestida de negro que, indignada, dizia querer "a esquerda toda unida para derrotar o Passos". Com os repórteres a ouvir e registar a exigência daquela eleitora, a comitiva comunista passou ao largo e optou por parar junto a uma avó, 62 anos, ao pé de um carro de bebé com o neto a dormitar.
Tendo oportunidade de falar diretamente com um atento Jerónimo de Sousa, a senhora usou um tom baixo: "O meu avô esteve preso 12 anos e disse-me na cara, a chorar, quando foi o 25 de Abril: neta, a partir de hoje vais ter um futuro melhor do que o meu. Pergunto: que vai ser do futuro do meu neto?"
Jerónimo respondeu: "Se for a olhar para hoje é preocupante", mas importa "ter esperança de que é possível" - votando na CDU, gritavam os militantes a agitar as bandeiras da coligação - acreditar na mudança e em criar as condições para um futuro "sempre em torno dos valores de Abril."
Pelo meio, aos jornalistas que o questionaram sobre o crescimento do BE nas sondagens e o posicionamento do CDS depois de conhecidos os resultados eleitorais, Jerónimo de Sousa lançou umas farpas ao CDS e ao Bloco. Começando a resposta com um "ah! ah! ah!", o líder comunista acrescentou: "Esta vantagem de andar aqui há muitos anos dá-nos uma tranquilidade imensa, até porque o Bloco não é propriamente o nosso adversário. Aquilo que as sondagens no terreno nos dizem é que a CDU está a crescer e a crescer bem e que vamos ter uma grande votação."
"O BE anda na própria pista, desejo-lhe muita saúde, mas não é preocupação minha", adiantou Jerónimo, para se focar depois no CDS. "A história demonstra" que o partido de Paulo Portas "está sempre pronto para tudo", pois "seja com este ou com aquele, desde que esteja no poder, está sempre disponível" para alianças, enfatizou.