Proteção de dados "é o livro sagrado dos negócios internacionais"
O esforço europeu para regular a proteção de dados estendeu-se a outros países do mundo ao longo dos últimos anos.
Cristina Caldeira, professora e coordenadora do Privacy and Data Protection Centre da Universidade Europeia e especialista na área da Propriedade Intelectual, sublinha a importância crescente de se protegerem os dados pessoais, quando hoje se assinala o dia internacional da Proteção de Dados.
Para a docente, os esforços europeus neste campo, que começaram ainda nos anos 80, culminaram na figura do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), que entrou em vigor nos Estados-membros a 25 de maio de 2018. "Não havia uma cultura de proteção de dados", recorda, notando que "os países estavam em níveis de entendimento muito diferentes". O ponto de viragem foi mesmo o "sistema sancionatório mais exigente", trazido pelas novas regras, que "transformou o regime brando da diretiva [sistema que vigorou até ao RGPD] num regime muito mais gravoso".
Ainda assim, Cristina Caldeira acredita que "alguns países não estejam ainda sensibilizados para esta matéria com a profundidade que era exigida". Prova disso é o aumento sancionatório registado em 2020: as coimas pela não aplicação do RGPD subiram 39%, totalizando 158,5 milhões de euros. "Itália, Alemanha e França são os países mais prevaricadores".
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Cristina Caldeira , professora e Coordenadora do Privacy and Data Protection Centre da Universidade Europeia Especialista na área da Propriedade Intelectual
© DR
Mas a docente sublinha o ponto de viragem deste regulamento, com efeito a nível mundial. "O RGPD hoje é, de facto, a bíblia dos negócios internacionais". "É importante verificar como o regulamento tem um impacto brutal no mundo", sublinha, notando que "em todos os continentes há países que alteraram a sua legislação para poderem aproximar-se deste rigor", notando que a discussão sobre um "quadro legal semelhante" ao regulamento europeu também é discutido nos Estados Unidos. E, com a entrada em cena da administração Biden, Cristina Caldeira acredita que o tema volte à mesa. "Até porque há tendencialmente uma aproximação à Europa".
Já sobre a possibilidade de as grandes tecnológicas norte-americanas poderem vir a ter um papel de pressão nesse cenário, a docente e investigadora nota que "as grandes empresas digitais já têm vindo a fazer um lobby fortíssimo na Europa", acreditando que "vai haver uma grande pressão" numa possível discussão sobre privacidade.
No entanto, numa altura em que a "economia de dados é fundamental para a aplicação de sistemas inteligentes e novas tecnologias", Cristina Caldeira acredita que "o interesse comercial poderá falar mais alto", já que a Europa não quererá perder este impacto, tal como os EUA.
Numa altura em que a economia de dados tem retorno financeiro significativo, destaca Cristina Caldeira, a docente acredita que "terão de ser ultrapassados lobbies e dificuldades criadas pelas grandes empresas".
O regulamento ganhará ainda mais força com o progresso tecnológico. "Não é apenas a proteção dos dados de uma maneira mais tradicional, mas o RGPD já teve a visão de fazer a ponte entre o direito e a tecnologia, acompanhando este salto tecnológico. Tanto a Europa como os Estados Unidos não podem coabitar um sem o outro", explica.
Neste dia internacional da Proteção de Dados, Cristina Caldeira considera que é comemorada "a materialização da própria democracia e da cultura de responsabilização de cada um de nós pela informação".
O tema estará em destaque num webinar da Universidade Europeia, intitulado "Justiça e Privacidade nas Comunicações Eletrónicas", que decorre esta quinta-feira.
Cátia Rocha é jornalista do Dinheiro Vivo
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