Presidente da Rede Anti-Pobreza Portugal fala de "despovoamento extremo" do Porto
O Porto sofre de um "despovoamento extremo" em que as pessoas "são compulsivamente obrigadas a sair", o que resultou na "perda de 140 mil habitantes" nos últimos "40 anos", denunciou o presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza/Portugal.
Em entrevista à Lusa, Jardim Moreira falou de um problema que vai estar no centro da iniciativa "Pelo Combate à Pobreza e à Exclusão Social", que decorrerá entre os dias 17 e 24 de outubro, no distrito do Porto, promovido pela organização a que preside.
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Também pároco nas freguesias da Vitória e de São Nicolau, Jardim Moreira falou de uma realidade que conhece desde 1970, considerando, por isso que "a situação no Centro Histórico tem evoluído de uma forma quase descontrolada", alertando tratar-se de um "fenómeno de despovoamento extremo".
"As pessoas são compulsivamente obrigadas a sair. Não se vê a preocupação de defesa desta gente, dos idosos em particular, que sem dinheiro para rendas mais altas (...) acaba em bairros onde se vai sentir um estranho", acrescentou Jardim Moreira.
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E prosseguiu: "quando cheguei, em 1970, nas freguesias de Vitória e São Nicolau eu tinha, em cada paróquia, cerca de 12 mil habitantes. Agora não sei se tenho mil. Na Ribeira há 16 pessoas e na Rua de São Miguel não chega a 15 pessoas, quando era a rua mais populosa".
Continuando a denúncia, o presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN na sigla em inglês) afirmou haver "ruas que praticamente estão sem habitantes", reivindicando, por isso, uma reflexão sobre a "sustentabilidade do território e interação do poder com os residentes".
Como resposta da "sensibilização" que foi fazendo às autoridades, disse ter recebido "lamentos", afirmando que mais do que "impotência" é a "indiferença das pessoas da cidade aos problemas que estão a acontecer" a manifestar "uma irresponsabilidade quase coletiva".
"Há alguma coincidência entre a avalanche turística após a chegada de Rui Moreira à presidência da Câmara do Porto e o agravar do problema da habitação na cidade", admitiu o responsável, criticando ainda a "prioridade" dada ao "turismo, de uma forma inequívoca, como se fosse não só a solução para o Porto, como também para o país".
Comparando com a realidade que encontrou em 1970, quando iniciou as funções de padre no Porto, Jardim Moreira enfatizou que a cidade "perdeu 140 mil habitantes, um terço da sua população", facto que o fez questionar a lógica que disse imperar na cidade, por oposição à que vigora a nível mundial.
"Há uma questão que não sei responder: quando todas as políticas a nível mundial dizem que o futuro da Humanidade passa por um aglomerado urbano nas grandes cidades, o Porto faz o caminho inverso", observou, baseando-se também em números de 1918 que apontavam que "55% da população mundial já vivia em grandes cidades".
Nesta lógica, disse, no Porto hoje há "passantes e os passantes não são portuenses nem portugueses", situação que, reiterou, "vai pôr em causa a sustentabilidade do território", pois as pessoas "foram arrumadas para bairros na periferia".
Ainda assim, Jardim Moreira mostra-se otimista perante a eventualidade de o processo de saída dos portuenses do centro da cidade vir a reverter no futuro.